quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

O Amor como Antropofagia Alienada

Semanas atrás tivera a intenção de debater, via vídeo-aula, o conceito de amor na filosofia platônica, algo no mínimo interessante e por que não ainda muito atual.
A humanidade, entre tantos questionamentos, ainda hoje se debruça sobre o que seria o amor: um impulso cerebral ou hormonal, um sentimento sem explicações lógicas, uma manifestação da cultura, algo fenomênico e refletido por uma série de mecanismos sociais, etc.
O fato é que o amor, como hoje o conhecemos, fluido, líquido, irregular e inconstante é fenômeno passível de compreensão e historicidade. Não é sem razão que uso os termos "líquido, fluido" emprestados de toda uma terminologia sociológica, em especial a apresentada pelo polonês Zigmunt Baumann, pois o amar hoje, mais do que nunca é tão rápido e veloz, como fenômeno, comparando-se ao clique de um botão de celular ou de um teclado de computador conectado em rede.
Esqueçamos o romantismo de nossos pais, avós, que lutaram por uma liberdade de escolha, rompendo com antigas tradições que ligavam o amor a um projeto sócio-econômico familiar. Os grilhões de todas as paixões humanas estão hoje muito mais do que frouxos, estão assustadoramente frágeis, transformando o amor em instantaneidade.
E quando rememoramos o sentido do instantâneo não podemos deixar de encarar o sentido do "consumo rápido", e assim vamos hoje consumindo o amor na forma de uma embalagem, adquirida no mercado das insuficiências ou carências humanas, e nossos vazios, travestidos de desejos, de um eterno porvir, são profundezas abissais condenadas a busca.
É fácil vislumbrar esta nova realidade, você que me lê compare-se a seus pais, avós; eu mesmo fazendo este exercício com apenas 32 anos de idade já tivera experiências amorosas numa quantidade muito maior que meu pai, e nem se fale comparado ao meu avô, e provavelmente os meus filhos e netos que surgirão na aurora terão uma vida amorosa com uma variedade de experiências ainda maiores. A dúvida, a pulga atrás da orelha, é fazer ou não o questionamento ético disso.
Devemos olhar para o amor contemporâneo como uma nova dinâmica social, sem freios, ou devemos olhar para este de maneira crítica? Mas, seria interessante para a humanidade fazer a roda da história girar ao contrário e reafirmarmos o dito amor romântico, criado e difundido a partir do século 19 onde homens e mulheres apaixonados morriam de amores na forma de tuberculose?
O que mais me assusta nesta nova dinâmica social, ainda mais quem trabalha diretamente com a juventude (sou educador, em sala de aula desde 2004) é sentir, com convicção, que estamos nos consumindo uns aos outros, como objetos. Tornamo-nos, como profetizava Karl Marx desde sua juventude, algo reificado.
Alienamo-nos a tal ponto, entregamo-nos aos desvarios das lógicas de mercado e ao ethos capitalista de maneira que hoje não mais agimos como humanos diante de humanos, mas como objeto de desejo diante de outro objeto de desejo, como duas bocas famintas que se devoram.
Lembro-me do ano de 2003 quando num rompimento amoroso, com uma mulher que estava saindo a pouco mais de um mês, a mesma se justificava dizendo "você não tem nada a me oferecer"....e eu ali, me sentia como um empregado a ser despedido por maus serviços prestados. 
Quando as pessoas se aventuram na ideia ou na tentativa de iniciar uma relação a dois, fácil de se iniciar, não é difícil que nas primeiras manifestações de dificuldades ou desafios um dos lados pense "não me sinto satisfeito", este objeto não mais alimenta os meus desejos, melhor voltar ao mercado e buscar algo que me preencha, nem que por um instante.
Não há paciência para construir algo, não há tolerância com o outro, somente cobrança, expectativas, consumo. E assim vamos colecionando experiências, antropofágicas, aqui, ali, acolá.

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