domingo, 24 de abril de 2011

Crítica ao Marxismo Pragmático

Após a leitura de um artigo escrito pelo colega sociólogo Eduardo de Oliveira Santos, a quem recomendo a leitura de seu "Hipocrisia e Individualismo: o novo dualismo marxista da era contemporânea", faço uso de meu blog para rebater algumas ideias contidas no texto, especialmente quanto ao uso, inapropriado, do marxismo.
O marxismo ainda é uma ideologia muito atuante, em movimentos sociais, partidos políticos de esquerda, na academia universitária, na práxis de qualquer pensador interessado na compreensão da vida em sociedade, dos conflitos humanos numa realidade de divisão social e violência de classe. 

Se enganam os idiotas que relacionam o fim do dito "Socialismo Real" (implementado ao longo do século XX, numa série de governos autoritários, governados por partidões/núcleo duro) a uma desqualificação do marxismo como ideologia. Aqueles que leram Marx com a devida atenção sabem, com facilidade, que estes regimes políticos do século XX fazem uso da teoria marxista, mas não são, definitivamente, marxistas. O que houve foram uma série de desusos da teoria marxista, utilizada como meio, não como fim ou projeto político verdadeiro-igualitário.
 
Usaram e hoje os hipócritas usam o marxismo por compreenderem que este, em seu discurso, ainda é uma argumentação poderosa, ancorada na promessa de construção de um devir igualitário, libertando o povo de seus grilhões históricos: Estado, sociedade de classes, Igreja, proprieda privada, etc.

Mas o uso que hoje os hipócritas fazem de Marx, deturpado como fizeram Stalin, Mao, Fidel, Lenin, segue numa mesma direção, perversa: a teoria marxista como argumento teórico de conquista do poder, de tomada do Estado por partidos, seja numa lógica declaradamente autoritária seja sob o véu de uma democracia liberal falsificada.

É incorreto, como afirma o colega Eduardo, apontar possíveis Marxismos adulterados como "líquidos", "darwinista", o termo que melhor expõe este uso malogrado da teoria marxista, que contraditoriamente reforça a exclusão social e fortalece o Capital, seria "Marxismo Pragmático". E o que seria este pragmatismo? O uso do discurso marxista para a sedução das massas, sempre ávidas por lideranças interessadas em guiá-las nos caminhos da verdadeira libertação: a revolução social. Contudo, como falar em revolução social após a queda do "Socialismo Real" do século XX virou uma espécie de tabu, onde todas as utopias parecem corroídas pelo dito fim da História, resta aos pragmáticos utilizarem do discurso marxista, de caráter classista, igualitário, comunitário, socializante, de maneira a conquistar seus votos, cadeiras em Parlamentos, a cada período eleitoreiro, reafirmando a conquista do poder por oligarquias políticas travestidas de partidos (todos, digo todos, sem nenhuma base social real e sem ancoragem ideológica alguma, vide o novo partido kassabista, PSD, uma excrescência).

O que há nos dias de hoje é, por incrível que possa parecer, uma utilização weberiana (própria de uma racionalidade weberiana) da teoria marxista, tendo a conquista do poder como objetivo a ser alcançado (pela via democrático-liberal, de democracia representativa, do voto). E esta utilização do marxismo, pela via do discurso, ainda poderoso como essência, é um fenômeno puramente metodológico - não usa o marxismo mais no sentido em que este fora construído por Karl Marx ao longo do século XIX, de projeto político para a revolução social; não usa mais o marxismo para a chegada e tomada do poder por um partidão declaradamente autoritário, afinal o autoritarismo levado ao extremo nunca se sustenta (vide fascismos, à direita e a esquerda); usa-se o marxismo como discurso as massas, não para revolucionar as suas vidas, mas para convencê-los nas urnas, votando nos políticos, nos partidos ávidos por poder e por controle estatal (afinal a máquina de Estado oferece ganhos, posições, cargos, empregos, cabides, privilégios) de que eles serão sempre os mais capazes de gerenciar as coisas do Estado, as coisas do mundo do Capital, garantindo que o povo coma mais e melhor, que compre mais e melhor, mas nunca, nunca, que este se liberte das garras do Capital.

O pior de tudo isso é que o próprio Marx já vislumbrava este mau uso de suas ideias, e este mesmo, quando questionado em vida dizia-se não ser "marxista". A tomada do poder, a tomada do Estado, por forças revolucionárias, de origem proletária, de extensas e profundas raízes sociais, é apenas uma etapa do objetivo maior e essencial: do reestabelecimento da vida em comunas, sem Estado, sem autoridades, sem propriedades, ao que damos o nome de Comunismo, meta comum a todos os homens verdadeiramente de esquerda, sejamos socialistas ou não, anarquistas, etc.

E assim, a melhor maneira de desconstruir este marxismo pragmático, de renunciar ao velho marxismo-leninismo, é, sem revisionismos, fazer um exercício de retorno ao próprio Marx, trazendo a tona as suas máximas, válidas quando se trata de uma sociedade Capitalista: o Capital aliena, divide, reforça a vida em classes, vivemos sob a égide da dominação de classe e que a sua superação só se dará de forma violenta, com derramamento de sangue (lembremos, a violência como parteira da História), a propriedade é algo a ser abandonada, e que o homem só se realiza, inclusive suas potencialidades, através de sua existência coletiva, imersa no tecido social (sozinhos, praticamente inexistimos).

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