terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Mulheres, fantasia e realidade: equação difícil

Um homem de 45 anos, viúvo, dono de um pequeno hotel parisiense, uma mulher de 20 anos, noiva de um jovem diretor de cinema e atriz. O local de encontro: Rua Julio Verne (alusão ao autor de literatura fantástica, como na obra “20 mil léguas submarinas”), em um espaçoso porém envelhecido apartamento a ser dividido/alugado por ambos. Este é o enredo central do ainda polêmico filme do italiano Bernardo Bertolucci “O Último Tango em Paris”.
Dias atrás tomei a liberdade de revisitar o filme, numa destas noites solitárias belo-horizontinas, regada a vinho tinto chileno no copo e toda a atenção na película. Queria, mais uma vez, tentar compreender aquela relação homem-mulher, talvez numa busca inconsciente pela compreensão do incompreensível.
A proposta inicial da relação era simples: os dois se encontrariam sempre naquele apartamento, local de suas fantasias e ardor sexual pulsante, porém com a condição de nada trazer “o que vem de fora” para dentro daquele lugar, quase sagrado de puro hedonismo – daí nada de contar a sua história de vida, projetos, nem ao menos o próprio nome.
Tudo ia muito bem entre o casal, até que o personagem de Marlon Brando repentinamente absorve a recente perda da esposa (que suicidou-se em uma banheira após cortar os pulsos com uma navalha) e por um ato de coragem decide ir além: se propõe a amar.
Quando ele leva a amante a decisão de mudar, de construir uma relação real, com amor, nomes, angústias, histórias, projetos e planos para o futuro, ele acaba por frustrar-se quando recebera um seco e inquieto “não”. Como não compreendia a negativa daquela mulher, agora a quem ele queria entregar-se por inteiro, ele a persegue pelas ruas de Paris – levando-o a morte (ela lhe desfere um tiro a queima-roupa). Um final trágico, certamente.
Deste filme eu poderia recolher uma série de pensamentos, passando até pelo que eu chamo de “amor existencialista” (pegando como exemplo a liberdade defendida por Sartre e a proposta de amor-livre, como o próprio filósofo francês mantivera com sua amante Simone – que tanto agitaram os anos 60, numa espécie de contracultura típica a partir do maio de 68), mas o que me perturba, no sentido positivo do termo, que me faz refletir, me tira do lugar comum e me move a pensar criticamente é a mudança apontada no filme: o quanto a fantasia pode ser mantida numa relação homem-mulher, e se somente a fantasia é o que valeria a pena numa relação amorosa. O real, a labuta, os projetos em comum, a construção de algo a dois, seria realmente uma utopia humana?
Na minha vida pessoal posso encontrar momentos semelhantes, numa épica batalha entre fantasia e realidade, e como no filme, quando a realidade entra em jogo e se assume como base poucas foram as vezes que uma relação a dois seguira adiante: estaríamos todos nós cansados do real? Estaríamos todos nós absorvidos pelo sonho, pela fantasia, pelas facilidades, falsas, criadas pelo mundo do capital? O que eu quero: uma mulher imersa na fantasia e indisposta a realidade ou o contrário, uma mulher consciente e ávida por realidade, porém crua a ponto de nada fantasiar? Pois é, eis a questão que eu creio jamais conseguir responder.

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