segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Angélica e Huck - protótipos do falso-eu

A estrada pela qual o amor percorre o seu caminho nunca é reta, pavimentada, tranquila; é cheio de curvas, perigos, buracos no caminho, em suma algo tortuoso, irregular e repleto de erros.

Em Veja desta semana o casal Luciano Huck e Angélica despontam como "exemplo" que "deu certo" em meio ao chamado "mundo politicamente correto", ou pior, "bonmocismo". São jovens, saudáveis, ricos e ambos com uma carreira profissional bem sucedida - protótipo perfeito para um comercial light, onde a família nuclear, vivendo em seu condomínio de luxo, sai de carro para passear num ensolarado domingo após um maravilhoso café da manhã com frutas, iorgutes e cereais (tudo muito clean).

Nada mais distante do real. Já não mais existe o "núcleo familiar", e sim uma variedade familiar, beirando a uma tipologia. Vive-se em um mundo onde milhares e milhares ainda morrem famintos, convivem com conflitos dos mais diversos, e trabalham a vida inteira para alcançar nada mais que a sobrevivência (sem luxo, sem diversão, sem prazer, uma vida robótico-estóica rumo ao simples acordar-trabalhar-comer-dormir).

No entanto a humanidade, até como forma de sabotagem de si mesma (o ser humano parece gostar de sofrer), insiste em buscar tipos ideais, modelos perfeitos, sempre tendo como referencial a ética judaico-cristã ou ocidentalizada (imersos na lógica do Capital, de conquista de posições sociais e conquistas materiais).

Em minha vida, familiar e pessoal, tantos são os exemplos de como a realidade é distante de qualquer proposta prototípica: o pai ausente e machista, o avô materno ausente e cercado de mulheres/outras famílias, a mãe separada e carente, a irmã e seus longos relacionamentos marcados por neuroses e crises de ciúmes intermináveis; e eu com minhas aventuras, desventuras, idas e vindas, erros e acertos.
A vida não é um conto de fadas, longe disso. Viver não é sucesso todo dia, é tristeza também, é arrepender-se, ou como diria o compositor Lobão "lamber sarjeta". Para se tornar humano, real, existente, é preciso que um dia você sinta o gosto amargo de uma sarjeta, de eventos que ocorrem em sua vida e te joguem no buraco, pois será na solidão do sofrer que sozinho, sem ajuda de nada ou ninguém, mas pela simples força interior e vontade de potência (no sentido nietzschiano mesmo, de tesão pela vida, pela sua projeção e imersão no mundo) você consiga atingir uma espécie de nirvana material, um estado de consciência plena que lhe trará a certeza sarcástica: viver é isso mesmo, faz parte da roda de minha história.

Claro que este nirvana material, esta consciência de si e para si, vai ser muito mal entendida por aqueles que insistem em alienar-se, sofrendo, copiosamente, por ainda não atingirem o nível "Angélica-Luciano-Huck de satisfação", de não serem eles os protótipos existenciais; por isso que coluna social vende jornal e se insere na televisão, por isso que a sociedade do capital se traveste como sociedade do espetáculo (vide a análise de Guy Debord), por isso você idiota mediano assiste ao Big Brother Brasil e compra revista de celebridades, o mundo do capital, o mundo do engano e do falso-eu quer que você continue nesta busca em direção ao nada, pena que você só percebe isso, na maioria dos casos, quando a morte bate as portas e você diz "eu não vivi a minha vida, eu não fui eu mesmo".

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