terça-feira, 30 de março de 2010

Big Brother e o Brasileiro Acéfalo

Amanhã, dia 30/03, chega ao fim mais uma edição do não menos infame Big Brother Brasil 10, comandado pelo pseudo-intelectual Pedro Bial. 
Como o nome do programa aponta, "Grande Irmão", este fenômeno (vigiar as pessoas, a todo instante, eliminando toda intimidade e subjetividade) não é algo novo em nossa cultura; bom exemplo disso, inclusive no nome dado ao programa (que não é uma criação televisiva tupiniquim, mas sim um enlatado da tv holandesa) é o livro de George Orwell* "1984" aonde em uma sociedade vivendo em regime de Estado Policial (extremo conservadorismo e autoritarismo, semelhante aos fascismos do século XX) temos a presença do "Grande Irmão" (Big Brother) que tudo vê e a todos observa.
De maneira análoga ao programa global o "brother" orwelliano se faz presente na forma de uma tela de televisão, de um equipamento que está alocado em todos os recantos da sociedade, de forma vigilante, garantindo a ordem imposta pelo Estado Policial (que na obra tinha como uma de suas proibições a prática sexual).
O "brother" global, criado na Holanda, difundido pelo mundo, e com sucesso garantido em nosso país (em outros países a atração literalmente não pegou, e na Ásia há casos de interrupção de sua exibição pelo atentado cultural que este modelo televisivo representa) não faz sucesso em terras brasilis por mero acaso, ou mesmo por imposição da mídia demoníaca. O brasileiro tem, culturalmente, um fascínio pela lógica do "brother", em suma, pelo autoritarismo e pela vigilância (muitas vezes travestida como fofoca, de maneira a pormenorizar o nosso ranço cultural e o nosso apego ao autoritarismo).
O brasileiro quer ver, quer olhar, quer saber, o que o outro faz, o que o outro pensa, como o outro age, o outro, o outro, sempre o outro. Olhar para si mesmo, enxergar dentro de suas entranhas os sentidos de sua vida miserável, ser crítico, isso não, afinal de contas o "povo brasileiro gosta de luxo" (como costuma parafrasear o nosso presidente operário-filósofo de butiquim).
O povo do Brasil assiste o Big Brother, e não só assiste, se encanta e dá força ao programa, porque ele quer, essencialmente, não ver a si mesmo, não quer enxergar o real, e ai viva o aparente, a sociedade do espetáculo no sentido mais ilusório do termo (debordiano). Assistir o Big Brother Brasil é uma espécie de platonismo as avessas, em busca da luz, do mundo puro e idealizado, porém não no sentido em direção ao conhecer mas no sentido inverso, no sentido do desconhecer (e pior, desconhecer a si mesmo).
Isso fica fácil de perceber na própria escolha dos participantes destas 10 edições do programa, todos esteriotipados (de maneira a aglutinar o maior número de gostos, por assim dizer). Claro que os vencedores, em sua maioria, sempre são aqueles que mais se aproximam do ideário nacional de homem/mulher (claro, muito distante do real). Dai um mundo repleto de corpos malhados, num dia-dia onde o exercício físico extrapola o campo da saúde e cai na banalidade da estética alienada (corpos à venda, como em um açougue); pessoas que nada tem, de concreto, a dizer, a argumentar, e que chamam a atenção pela futilidade linguística (nunca se toca em questões nervosas do dia-dia, abrindo espaços para falatórios, muitas vezes grosseiros e pasteurizados, sobre temas como a sexualidade, o amor, a vida em família; religião, política, questões da vida em sociedade, são tabus, afinal, pensar e falar sobre isso é tirar o telespectador da nave brother em direção ao abismo e trazer o mesmo para a realidade objetiva).
Amanhã, dia 30/03, ninguém comentará o metrô de Salvador que a mais de 10 anos está com obras paradas, ninguém comentará que os educadores mineiros e paulistas estão em greve, que o Catolicismo está num mar de lama e meio a sucessivos e crescentes casos de pedofilia, que as grandes corporações capitalistas e os seus lobistas lutam dia-dia contra o estabelecimento de uma saúde pública nos Estados Unidos, que na sua rua ou perto de sua casa existem crianças pedindo esmola na rua e cheirando cola de sapateiro, que a violência intra-familiar ou doméstica está saindo totalmente fora de controle, nada disso e tantas outras questões serão discutidas neste 30/03 mas sim quem vencerá o Big Brother Brasil 10: Cadu? Fernanda? Dourado?
Eu tenho a resposta: as Organizações Globo e os interesses que a ela sempre representou (o grande Capital).

*Eric Arthur Blair (Motihari25 de junho de 1903 - Londres21 de janeiro de 1950) foi um jornalistaensaísta e romancista britânico, que escreveu sob o pseudônimo George Orwell.
Sua escrita é marcada por descrições concisas de eventos e condições sociais e o desprezo por todos os tipos de autoridade. É mais conhecido por suas duas obras maiores, Nineteen Eighty-Four (1984), crítica ao autoritarismo, e Animal Farm (Revolução dos Bichos), uma sátira ao stalinismo.


Um comentário:

  1. Tiago, foste brilhante em tua análise, mais uma vez!!! Gui Debord foi um visionário para a sua época. Eis a evolução tecnológica na sua mais importante função,a de substituir o Panóptico, ou seja, manter o controle dos corpos e das mentes a favor da sujeição, da imbecilidade, alimentando substancialmente o monstro que habita o senso comum. Naquele grupo criteriosamente selecionado para o programa, surge a identificação do nosso alienado brasileiro com a fantasia de 'playboyzinho tatuado e sarado' e da mulher 'bombada', todos exercendo total submissão ao filósofo da 'mídia mortífora' que, além de asfixiar a criatividade, através da manutenção de uma vida estereotipada, reforça comportamentos acentuadamente exploratórios e competitivos, acirrando ainda mais a luta diária pelo capital (simbolizado pelo prêmio de 1.000.000,00 R$$$$$$$$$),de forma desumana e indigna, jeito perverso de tirar o tapete debaixo dos pés de seu irmão, para derrubá-lo de vez. O tratamento "brother" ameniza e ajuda a diluir a ideia de competitividade, criando uma suposta irmandade entre seus pares. Aqui mesmo, em Porto Alegre, temos uma famosa rede de hipermercados que obriga o tratamento entre todos os seus funcionários desta forma: 'mana' e 'mano', não importando a hierarquia entre eles (menos com o "pai" patrão, é lógico!)Eis uma estratégia para torná-los humanamente massificados, descaracterizando o ambiente e os laços profissionais e passando a todos a mensagem subliminar "somos uma grande família, unida em prol da riqueza dos seus pais-patrões". Nada está isento de objetivos, principalmente quando o maior deles é a subserviência, o servilismo, a negação da própria subjetividade em nome da riqueza (econômica, intelectual-elitista, social, etc.)de seus 'comandantes'. Beijos, Tiago, por esta análise ter sido feita também de acordo com os estudos foucaultianos.

    ResponderExcluir